A bióloga Betúlia de Morais Souto conseguiu produzir a seda desses animais utilizando as bactérias Escherichia Coli (encontradas na flora intestinal). A descoberta abre espaço para o desenvolvimento de suturas médicas empregadas em cirurgias e coletes à prova de balas, entre outras aplicações. “Poderemos deixá-las mais flexíveis, ou menos, da forma como desejarmos”, explica.
As bactérias funcionam como um importante instrumento para obter o material, uma vez que permitem a fabricação em quantidade controlada. O método evita a criação das aranhas em cativeiro, ambiente de difícil adaptação, além da dificuldade de retirar a seda diretamente do organismo dos animais.
Para chegar ao resultado, foi preciso inserir fragmentos de código genético do aracnídeo na bactéria. O processo, conhecido como tecnologia do DNA recombinante, consiste em enxertar os genes de modo que a estrutura orgânica do microrganismo produza as proteínas, com a multiplicação da E. Coli.Infográfico: Apoena Pinheiro/UnB Agência
FLEXIBILIDADE – O estudo da bióloga segue a mesma linha de outra pesquisa feita na UnB, também com a aranha Nephilengys, mas voltado para a identificação dos genes responsáveis pela produção dos diferentes tipos de sedas e suas características mecânicas, ambos sob orientação do pesquisador Elíbio Rech.
A pesquisa, uma tese de doutorado da cientista Daniela Matias Bittencourt, mostrou que o fio da moldura reúne a característica de esticar até 27,84% da sua dimensão e requerer força de 1 x 105 J kg-1 para se romper.
O kevlar, material usado na indústria aeroespacial, carros de corrida e coletes à prova de balas, extremamente resistente, possui extensabilidade de 5% e requer menos força, 3 X 104 J kg-1, para se partir.
Segundo Daniela, usar as proteínas da teia na indústria é apenas uma questão de tempo. “As qualidades mecânicas da seda são muito impressionantes. Com certeza vai trazer grandes possibilidades de produção de materiais com novas características mecânicas ”, diz.
Além de mais tecnologia para o mercado, Daniela visualiza benefícios à proteção do meio ambiente. “O kevlar vem do petróleo, que não é renovável. Mas se conseguirmos produzir proteínas tão resistentes quanto aquelas feitas em laboratório, teremos qualquer material de forma sustentável.”
PATENTE
- As seqüências utilizadas na transformação genética são responsáveis pela produção da seda. A UnB efetuou um pedido de patente que restringe aos estudiosos da universidade os estudos com esses fragmentos.
- Betúlia utilizou, na sua dissertação de mestrado, a seqüência genética responsável pela produção da seda de uma aranha nativa da Mata Atlântica, a Nephilengys cruentata, reforçando que a biodiversidade brasileira guarda excelentes oportunidades, tanto científicas quanto econômicas.
Aranha mais primitiva também tem seda
As caranguejeiras sempre foram tidas como rudimentares por caçarem no chão, apenas com suas patas. Além disso, seriam menos complexas por ter, ao contrário de outras espécies, apenas uma ou duas glândulas indiferenciadas de fios para fazer o casulo embaixo da terra ou em cima de arvores, com seda e folhas.
Apesar de suas características, essas aranhas terrestres ou arborícolas podem estar no início da cadeia evolutiva que deu origem às aranhas orbiculares, como a Nephilengys, que produzem a teia em orbital.
A pesquisa de Daniela descobriu nas caranguejeiras da floresta Amazônia, a Avicularia juruensis, seqüências referentes a sedas das aranhas que fazem teias. “Encontramos seda que nunca havia sido descrita nesse tipo de aranha”, conta Daniela. Pela primeira vez, esse conhecimento surge na literatura científica.
CONTATO
Betúlia de Morais Souto pelo e-mail betuliasouto@gmail.com.
Daniela Matias de Carvalho Bittencourt e-mail bittencourt@cpafac.embrapa.br, bittencourt.dani@gmal.com.br
Perfil:
Betúlia de Morais Souto é mestre em Biologia Molecular pela Universidade de Brasília (UnB), onde também concluiu a graduação em Ciências Biológicas.
Daniela Matias de Carvalho Bittencourt é doutora e mestre em Biologia Molecular pela Universidade de Brasília (UnB). Graduou-se em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Atualmente é pesquisadora da Embrapa Acre.
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